A nove dias do primeiro turno das eleições, o
Ministério da Economia anunciou nesta quinta-feira (22) a necessidade de um
novo bloqueio de R$ 2,6 bilhões no Orçamento de 2022 para evitar um estouro no
teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à variação da
inflação.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a contenção
nos gastos vai atingir emendas parlamentares que foram liberadas há apenas duas
semanas, o que irritou integrantes do Congresso Nacional e criou confusão entre
aliados do governo Jair Bolsonaro (PL) —que vinham sendo beneficiados pela
medida.
O bloqueio atrapalha os planos do presidente da
Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, que
queriam acelerar a execução das chamadas emendas de relator diante do risco de
revés em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre a legalidade do
instrumento.
As emendas de relator são usadas como moeda de
troca nas negociações políticas com o Congresso e costumam privilegiar aliados
do Palácio do Planalto.
Com o novo bloqueio, o total de despesas que
ficam travadas sobe a R$ 10,5 bilhões.
O secretário especial de Tesouro e Orçamento,
Esteves Colnago, não detalhou quais despesas serão alvo da contenção,
informação que deve ser divulgada até o dia 30 de setembro. Ele buscou
minimizar os impactos negativos do anúncio.
“A necessidade de bloqueio é uma fotografia
deste momento”, disse. “A gente imagina que até o fim do ano vamos conseguir
descomprimir isso”, disse Colnago.
Atualmente há entre R$ 19 bilhões e R$ 20
bilhões em despesas não obrigatórias que não foram ainda executadas e são
elegíveis ao bloqueio. Desse montante, cerca de R$ 3,7 bilhões são emendas de
relator. O restante está distribuído em ações nos ministérios.
Membros do Congresso que atuam na negociação
das verbas de relator já foram avisados pelo Ministério da Economia na
quarta-feira (21) sobre a mudança nos planos de liberação dos recursos.
Em 6 de setembro, Bolsonaro editou um decreto
para antecipar a liberação de R$ 3,5 bilhões em emendas de relator e outros R$
2,1 bilhões para ministérios, na expectativa de que o relatório bimestral de
avaliação do Orçamento apontasse na sequência a viabilidade desse alívio.
Mas não é o que o relatório mostra. Técnicos do
governo identificaram um crescimento inesperado de despesas com benefícios
previdenciários, o que reduziu o espaço orçamentário e forçou o novo bloqueio.
Mesmo com o vaivém, o secretário defendeu o
decreto editado por Bolsonaro, que permitiu à Economia incorporar, de forma
antecipada, mudanças legais que resultem em alterações na previsão de despesas.
O ato abriu caminho para o governo remanejar os
R$ 5,6 bilhões, após o chefe do Executivo assinar duas MPs (medidas
provisórias) para adiar para 2023 ou limitar despesas de ciência e cultura
aprovadas anteriormente pelo Legislativo. A manobra foi revelada pela Folha de
S.Paulo no fim de agosto.
“Não entendemos que foi precipitado [liberar os
recursos]. O decreto permitiu a flexibilização do Orçamento para atender aos
diversos órgãos e será um instrumento importante daqui para frente”, disse.
“A gente liberou R$ 3,8 bilhões [da lei Paulo
Gustavo], estamos fazendo bloqueio de R$ 2,6 bilhões, então ainda tem um ganho
de R$ 900 milhões. Temos também a parte que foi uma movimentação interna dos
recursos do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico]”, afirmou Colnago.
Segundo ele, o decreto é importante para
ampliar os instrumentos de que o governo dispõe para administrar as necessidades
de gastos dos ministérios, mas ele destacou que isso sempre será feito
respeitando o limite geral do teto.
“Tenho que fazer gestão do dia a dia, preciso
ter essa liberdade de poder descontingenciar ao longo do exercício, cuidando
para não descumprir a regra fiscal”, disse. “O fato de ser RP 2 [despesas dos
próprios ministérios] ou RP 9 [emendas de relator], não significa que aquela
política discricionária não é importante, não precisa ser atendida”, afirmou o
secretário.
A necessidade de aperto adicional no Orçamento
se deve principalmente ao aumento de R$ 5,6 bilhões na despesa com Previdência.
Isso ocorreu graças à redução da fila do INSS (Instituto Nacional do Seguro
Social), que estava próxima de 1,7 milhão de pedidos em espera em abril e caiu
a 1,1 milhão em agosto.
Segundo Colnago, só os benefícios
previdenciários tiveram alta de R$ 6,6 bilhões na previsão de despesas,
enquanto outros elementos, como sentenças judiciais pagas pelo INSS, tiveram
redução.
Os gastos com BPC (Benefício de Prestação Continuada),
pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, também aumentaram R$
2,1 bilhões.
Se por um lado a redução da fila é um alívio
para os segurados, que só recebem os valores após a análise do requerimento de
benefício pelo órgão, também significa uma fatura adicional para o governo —o
que retira espaço do teto de gastos. Até agora, a fila elevada acabava
cumprindo um papel de contenção de despesas.
“Houve uma redução da fila, e a maior concessão
de benefícios levou a um acréscimo das despesas obrigatórias”, disse Colnago.
“Grosso modo, tivemos crescimento de mais de R$ 8 bilhões [por causa dos
benefícios].”
O secretário destacou que o relatório bimestral
de setembro geralmente costuma proporcionar um alívio no aperto do Orçamento,
uma vez que as projeções de despesas obrigatórias começam a ser flexibilizadas
na esteira dos dados de execução ao longo do ano.
“De forma surpreendente, a gente teve um
aumento [neste relatório]. A gente não esperava um crescimento nessa magnitude
nas despesas obrigatórias”, afirmou Colnago.
Embora as despesas com benefícios tenham
crescido, outros gastos obrigatórios, como subsídios, tiveram arrefecimento e
ajudaram a evitar um bloqueio ainda maior.
Apesar do impasse nos gastos, o governo segue
colhendo bons resultados pelo lado da arrecadação. Pela primeira vez o
relatório trouxe uma estimativa oficial de superávit primário nas contas do
governo central (que reúne Previdência, Tesouro Nacional e Banco Central).
A projeção deve indicar um resultado positivo
em R$ 13,5 bilhões —na revisão anterior, a estimativa era de déficit de R$ 59,5
bilhões. O dado indica que as receitas recolhidas pelo governo vão superar os
gastos pela primeira vez desde 2013.
O número ainda poderia ser maior, não fosse uma
despesa contábil de R$ 24 bilhões decorrente do acordo com a Prefeitura de São
Paulo para encerrar a disputa em torno do Campo de Marte. Mesmo não tendo
havido nenhum desembolso no acerto de contas, o registro dessa operação
sensibiliza o resultado primário. Sem essa transação, o superávit seria maior,
de R$ 37,5 bilhões.
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